TOKYO-GA (Wim Wenders, 1985)

Ihering Guedes Alcoforado
2 min readJan 18, 2021

IHERING GUEDES ALCOFORADO

No mergulho que Wim Wenders faz no universo de um dos seus mestre, Yasugiro Ozu depara-se não só com dois dos seus colaboradores icônicos: o ator Chishu Ryu e o seu ex-assistente e diretor de fotografia, Yuharu Atsta, mas também com dois outros mestres do cinema contemporâneo: Herzog e Cris Marker o resultado não poderia deixar de ser uma reflexão sobre o cinema, tendo como pano de fundo dois mundo: o de Ozu e seus colaboradores e o de Wim Wenders e dos seus contemporâneos.

A trama tem como pano de fundo o mundo de Ozu, tanto o substantivo que tomou como objeto da sua arte, fincado não a família e na comunidade tradicional japonês; como o simbolizado por meio da sua cinematografia; e, como foco uma reflexão sobre o cinema.Estes dois planos do mundo de Ozu funcionam como ponto de partida para dois questionamentos correlacionados que se expressam por meio de duas reflexões que se complementam.

O primeiro questionamento é expresso por meio da evidenciação do acerto da premonição de Ozu, diante das transformação em curso, em especial no pós-guerra, que levava a forma, até então vigente, de ser do japonês para o ralo, o que é mostrado por Wm Venders por meio das imagens de Toquio, tanto a) as externas que expressam de forma emblemática, o contraste com as imagens de Ozu, como também b) as imagens da nova maneira japonesa de estar no mundo expressa de forma emblemática pelas salas de Pechinko que, no seu silêncio barulhento propicia ao jogador uma sensação de felicidade, antes obtida no seio da comunidade, agora, por meio da perda da noção de si mesmo e da sua fusão com a máquina.

O segundo questionamento é sobre as vantagens da própria modernização do cinema, o que é evidenciado tanto pela resistência de Ozu na adoção das inovações, como na busca pela simplicidade da linguagem, o que o levou a abandonar recursos como travelling e panorâmicas, radicalizando a ponto de rodar com uma simples Mitchell fixa, por meio do que alcança o que Herzog sinalizou como a transparência das imagens, e inspirou a frase com que Wim Wenders abre o filme:

“Se no nosso século ainda houvesse alguma coisa sacra, se existisse algo como o sagrado tesouro do cinema, para mim, isto seria a obra do diretor japonês Yasugiro Ozu?

Enfim, Tokio-Ga é ao mesmo tempo, uma elegia ao legado de Ozu e ao próprio cinema, na sua essência.

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Ihering Guedes Alcoforado

Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal da Bahia.