THE ´INCULTURATION´ OF ECONOMY OF FRANCISCO: Some Challenges

IHERING GUEDES ALCOFORADO (Professor de Política e Planejamento do Departamento de Economia da UFBA)

Na Exortação apostólica A Alegria do Evangelho (Evangelii Gaudium), no tópico -Um povo, muitos rostos, 115–116, o Papa Francisco destaca a centralidade da “inculturação”, ao admitir que o cristianismo deve assumir “o rosto dos diversos povos onde for acolhido e se radicalizar”.

Assim sendo, pode-se considerar que a Economia de Francisco (EdF) baseada em princípios cristão, também deve ser submetida a um processo de múltiplas “inculturações”, o que coloca os comprometidos com a construção e implementação da EdF diante de um wicked problem (problema espinhoso), dado a enorme variação estrutural das instituições que ancoram as economias, em decorrência de suas distintas matriz culturais e a especificidade dos seus valores, não só entre as sociedades desenvolvidas e as sociedade tradicionais dos povos originários, mas também entre elas.

O desafio se configuração a partir do fato que a Igreja Católica tem na tradição do Direito Natural seu principal ponto de apoio, do qual herda a premissa que os seres humanos podem compreender as normas morais por meio do uso da razão independente de sua filiação religiosa, ou seja, não existe contradição entre fé e razão, dado que esta última é entendida como o suprema dávida divina. Fonte reavida com a Encíclica Fides et Ratio (1998) de João Paulo II e operacionalizada pelo documento da Comissão Teológica Internacional da Congregação para a Doutrina da Fé: In Search of a Universal Ethic: A New Look at the Natural Law (2009), no qual se mostra a necessidade e se aponta os procedimentos para obtenção de padrões éticos comuns. Iniciativas que do ponto de vista da política eclesial pode ser considerada como uma qualificação da Declaração conciliar Nostra aetate, aprovada pelos Padres conciliares do Vaticano II e promulgada por Paulo VI em 28 de outubro de 1965 que iniciou o processo de mudança da relação da Igreja Católica com as outras religiões.[TORNIELLI, 2020; KOCHHTHARA, 2020; BRODER, 1979]

De forma que a reflexão ética suscitada pela necessidade de inculturação da EdF deve partir deste legado, o que envolve uma compreensão das instituições estruturantes da economia a partir da diversidade das suas matrizes culturais e normativas. [POLANYI,2001] Diferenciação que pode ser apreendido partir tanto de instituições especificas, a exemplo do mercado, da firma e da moeda; ou a nível mais genérico, a exemplo da ordem econômica que reflete a diversidade cultural mesmo no âmbito das economias capitalistas desenvolvidas [HAL & SOSKICE, 2001]

Nesta nota me restrinjo a chamar atenção para os resultados das pesquisas antropológicas que abordam o papel da moeda inserida nas distintas matrizes culturais [1], tendo em vista evidenciar os contornos dos desafios postos a todos comprometidos com a inculturação ao longo do processo de construção e implantação da Economia de Francisco (EdF). Nessa direção registro que

“[…] the enormous cultural variation in the way in which money is symbolised and in which this symbolism relates to culturally constructed notions of production, consumption, circulation and exchange. It becomes clear that in order to understand the way in which money is viewed it is vitally important to understand the cultural matrix into which it is incorporated. This may seem a bland enough lesson, but it is one which has often been forgotten by anthropologists writing about money — and less culpably also by historians and sociologists. As a result they have commonly fallen into the trap of attributing to money in general what is in fact a specific set of meanings which derive from our own culture. At another level, however, our essays reveal a unity which underlies all of the apparently diverse examples they consider. This is to be found neither in the meanings attributed to money nor in the moral evaluation of particular types of exchange, but rather in the way the totality of transactions form a general pattern which is part of the reproduction of social and ideological systems concerned with a time-scale far longer than the individual human life”.[PARRY & BLOCH, 1989:1]

O que se pode considerar como convergente com o entendimento corrente sobre a centralidade das instituições, anunciado de forma magistral no plano mais genérico do capitalismo e do feudalismo por Polanyi, cujos evidências e insights foram recuperados no n. 2016 do Cuadernos Cristianismo i Justicia (Mercancias Ficticias — Recuperando a Polanyi para el siglo XXI) e que se pode considerar como um ponto de partida para nossa compreensão dos condicionantes históricos e culturais na conformação das economias

Enfim, os estudos básicos necessários a reflexão sobre a inculturação da EdF estão disponíveis, mas precisam ser processados tendo como telos a superação dos desafios postos pela diversidade cultural a todos aqueles comprometidos com a construção e implantação da EdF ancorada em princípios e ética cristã (católica) considerada universal. De forma que, no âmbito de uma agenda de pesquisa estritamente acadêmica imagino ser pertinente a exploração dos insights gerados pelo programa de pesquisa de Michael Phililps (1994) focada na busca de um meio termo entre a universalismo e ceticismo

NOTA

[1] Ao nos debruçarmos sobre a moeda, um exemplo emblemático de uma instituição estruturante da economia constatamos a diversidade a) tanto no passado objeto dos antropólogos que ressaltam a diversidade de simbolização da moeda nos povos primitivos em decorrência das suas especificidades culturais, b) como no presente quando os economistas dividem-se no que se reporta a moeda “metalistas” e “cartalistas” em decorrência de opções ontológicas e políticas distintas.[GOODHART, 1998]

BIBLIOGRAFIA

BRODY, Baruch., (1979) Intuitions and Objective Moral Knowledge IN Monist, v. 62, pp. 440–56.

CASASNOVAS, Guilhermo (ed.) (2019)Mercancias Ficticias (Recuperando a Polanyi para el siglo XXI) IN Cuadernos Cristianismo i Justicia, n.216. Barcelona: Fundación Lluis Espinal, nov. 2019

GOODHART, C. A. . (1998). The two concepts of money: implications for the analysis of optimal currency areas. European Journal of Political Economy, 14(3), 407–432.

HERRERA, Steve., (2019)Inculturation, Cultural Appropriation and Obliteration . IN Medium, Disponibilizado em 23 jan de 2019 e consultado em 05 de setembro de 2020. https://bit.ly/2GzChWs

KOCHUTHARA, Shaji George., Challenge of Doing Catholic Ethics in a Pluralistic Context IN Religions 2020, n. 11.

MEDINA, Néstor., (2018) Inculturation, the Catholic Church and the Cultures of the World: (Re)Configuring Faith and the Cultural. London: Brill, pp. 254–310

PARRY, J., & BLOCH, M. (1989) ‘Introduction: Money and the Morality of Exchange’, in Money and the Morality of Exchange (pp. 1–33). Cambridge: Cambridge University Press.

PHILIPS, Michael, (1994) Between Universalism and Skepticism: Ethics as Social Artifact.

POLANYI, Karl., (2001) The Great Transformation: The Political and Economic Origins of Our Time.Beacon Press 2 nd

TORNIELLI, Andrea., (2020)., Nostra aetate: o documento que abriu o caminho para o diálogo com as religiões. IN Vatican News, 16 junho 2020