POST COVID-19: Uma Especulação Sobre o Porvir do Campo Econômico (Ihering Guedes Alcoforado)
Parto de uma dupla constatação do campo econômico. A primeira é que o referido campo envolve duas realidades distintas, i) uma material que se corporifica na Economy e ii) e uma outra convencional que se expressa na Economics.
A segunda constatação se reporta ao fato que as duas realidades referidas compartilham um mesmo conjunto de premissas ontológicas sobre o sentido da relação do campo econômico com os recursos naturais e meio ambiente, a partir do que se estabelece um consenso operacional sobre a necessária subordinação da natureza e da lógica dos recursos naturais e do meio ambiente às convenções econômicas.
A terceira constatação é que o campo econômico opera a partir da consideração que não só os recursos naturais, mas também o meio ambiente não só podem como devem ser comoditizado e monetizado.
Essas três constatações configuram os fundamentos com os quais o campo econômico operava sua relação com a natureza até a emergência da crise do COVID-19, a partir de quando a relação de subordinação foi invertida e as ações de política econômica deixaram de se orientar pela Economics e passaram a ter como referência os parâmetros estabelecidos Epidemiologia do COVID-19
Do ponto de vista substantivo, a explicação para esse deslocamento deve-se ao fato que estamos diante não de um “evento” que não pode ser apreendido e equacionado a partir de um frame ancorado na Economics; mas de um “acontecimento” com múltiplas dimensões que se configura como uma realidade não-ergódica e, sobre a qual Paul Samuelson já afirmou que a economia não tem nada dizer, ao que acrescento, muito menos a fazer.
O resultado deste deslocamento do objeto da politica governamental se reflete com toda nitidez no desconforto de Paulo Guedes, o representante emblemático não só da Economics, mas também da Economy operada de forma integrada tendo como premissa subordinação da natureza ao campo econômico e que se expressa, entre outras formas, por meio da comoditização e monetização não só dos recursos naturais, mas também do meio ambiente. A crise do COVID-19 transfigurou Paulo Guedes num “zumbi” cujo discurso assentado na austeridade, até então o norte da política governamental e um dos esteios do governo, tornou-se simplesmente impronunciável. A ação do Estado passou a orientar-se no sentido de adaptar a Economy a dinâmica do COVID-19 tendo como telus a mitigação dos seus efeitos. Os economistas entram em quarentena e operam como meros gestores da crise, já que passa a definir as estratégias politicas matricial, a partir da qual todas as demais se ajustam são os epidemiólogos que, inesperadamente, passam a ter seus cinco minutos de fama.
Para nós economistas, envolvidos de alguma forma com a construção de politicas (policy making) resta aguardar a passagem do furacão para fazer o inventário do que vai sobrar da Economy e da Economics como esteio da política pública. Com relação a primeira Vernon Smith intuiu que, apesar das perdas contingenciais, tudo volta ao normal, os policy makers continuarão tendo um objeto. Já com relação a Economics como fundamento e esteio da política pública estou em processo de gestação de algumas dúvidas, as quais espero seja decorrência do isolamento e do distanciamento social imposto pela quarentena.