O ACESSO E ACESSIBILIDADE AOS SERVIÇOS DE SAÚDE — Um Approach dos Transportes — Ihering Guedes Alcoforado
A acessibilidade aos serviços de interesse geral (SIG), entre os quais destaco os serviços de saúde e educação é uma fonte significativa de desigualdade espacial na Bahia, e, consiste portanto num dos principais desafios a ser enfrentado pelos diversos órgãos envolvidos, a exemplo dos órgão dedicados a saúde, educação e transporte.
A contribuição do sistema de transporte de passageiros para a eficiência do sistema de saúde e de educação se dáraá por meio da acessibilidade aos serviços distribuídos/organizados espacialmente a partir do critério de complexidade e frequência da sua demanda ao longo da hierarquia da rede urbana vertebrada em torno de um polo regional.
Nesta nota introduzo o papel dos transportes no acesso e na acessibilidade aos sistemas de saúde dos residentes nas pequenas cidades e áreas remotas. O ponto de partida é uma diferenciação a partir da escala: i) os serviços que podem ser acessados sem necessidade de deslocar-se para fora da area do domicílio e ii) os serviços que só podem ser acessados fora da área do domicilio, entendendo-se por área de domicilio a que pode ser acessada a partir de um deslocamento pendular diário.
No primeiro caso se insere serviços da atenção primária a qual é reconhecida por Guagliardo (2004) como a forma mais importante de atenção à saúde para a manutenção da saúde da população porque é relativamente barata, pode ser prestada com mais facilidade do que a especialidade e a assistência hospitalar e, se distribuída de maneira adequada, é mais eficaz na prevenção da progressão da doença em larga escala.
Esse autor coloca com clareza e contundência a problema em torno do acesso e da acessibilidade dos serviços de atenção médica os quais podem ser considerados como aplicado aos serviços de complexidade mais elevada, ao chamar atenção para a centralidade que tem a distribuição geográfica dos serviços de saúde não só na manutenção da saúde da população, mas principalmente a maximização dos seus benefícios, o que torna imperativo não só nossa compreensão da distribuição geográfica dos serviços de saúde ao longo da hierarquia urbana, mas também da acessibilidade a esses serviços a qual pode ser evidenciada por meio das medidas mais populares de acessibilidade espacial para atendimento as demandas pelos serviços de atenção médica que reflitam o — i) impedimento de viagem para o provedor mais próximo e ii) portfólio da oferta da atenção médica dentro de determinada área.
No entanto, os instrumentos necessários para apoiar a implementação e acompanhamento das medidas de política territorial no que diz respeito à distribuição e acessibilidade de tais serviços são desigualmente desenvolvidos, já que a atenção se concentra nos serviços de saúde, enquanto os poucos estudos sobre a acessibilidade aos serviços de saúde ainda estão subdesenvolvidos. Os estudos geralmente se relacionam à escala (inter) regional e não à (intra)regional. Ao fazê-lo, perdem a especificidade local, pois muitas vezes consideram a existência / disponibilidade de serviços em uma determinada escala e não a capacidade real de atingir seus destinatário (muitas vezes apenas estimada) através da rede de transporte. O que torna central a distinção entre acesso e acessibilidade
Do Acesso a Acessibilidade
Neste âmbito algumas contribuições relevantes já são disponíveis em especial no que se refere a definição do “acesso”, embora compartilhem de uma limitação ao não avançar e tratar da “acessibilidade”. E, como desconsideram a acessibilidade não tratam das suas determinações associadas aos impedimentos decorrentes nas lacunas no sistema de transportes de passageiros na área. [KHAN & BHARDWAJ, 1994; PENCHANSKY & THOMAS, 1981; GUAGLIARDO et al, 2004; GUAGLIARDO,2004]
Em função disso é fundamental marcar a diferença entre acesso e acessibilidade de tal forma que se possa avançar na melhora da acessibilidade. Neste sentido Guargliardo (2004) chama atenção que o acesso tanto pode ser considerado como um substantivo como verbo. O acesso enquanto substantivo se refere ao potencial de uso na área de saúde, enquanto o acesso como um verbo se reporta ao ato de usar ou receber assistência médica, a partir do que o referido autor qualifica o acesso em duas etapas: a) o acesso potencial que é o disponibilizado e o ii) e acesso realizado que é efetivamente utilizado o que envolve a superação de todas as barreiras à prestação e depende da acessibilidade.
Mas vale ressaltar que temos uma diferenciação do “acesso” enquanto entrada no sistema de saúde, com uns enfatizando a entrada ou uso do sistema de saúde, enquanto outros ressaltando os fatores que condicionam a entrada ou uso, o que remete a acessibilidade âmbito no qual se inclui não só os aspectos éticos e de equidade como também os referentes a eficiência e/ou efetividade do sistema. [HADDAD & MOHINDRA, 2002; DANIELS, 1982]
As implicações dessa visão dual do acesso se manifestam em dois planos. No primeiro a enfase é nas características do provedor e do serviço. No segundo o destaque é nas possibilidades e expectativas dos usuários. Daí a necessidade da integração das duas óticas quando se leva em conta as características tanto do lado da oferta como da demanda, configurando uma definição taxonômica de “acesso” que contempla várias dimensões ponde em evidência a mediação do usuário com o sistema, a partir do que se configura uma teoria do acesso com suas múltiplas dimensões, o que assegura a presença da acessibilidade no seu núcleo duro.[PENCHANSKY & THOMAS, 1981:128–129]
2. Acerca da Acessibilidade
Cameron (1995) ao examinar a literatura sobre acessibilidade destaca duas definições: i) o acesso a um lugar depende de si ele pode ou não ser alcançado e, ii) o acesso é interpretado como a facilidade da viajem.[CAMERON, 1995:35]
O que aponta a possibilidade de abordar a acessibilidade por meio de etapas e dimensões. Os dois estágios amplos são “potencial” para a prestação de cuidados, seguida pela prestação de cuidados “realizada”. O potencial existe quando uma população carente coexiste no espaço e no tempo com um sistema de saúde disposto e capaz. A atenção realizada, às vezes referido como cuidado atualizado, ocorre quando todas as barreiras à preáriosstação são superadas, entre as quais estão as físicas que são transpostas pelos transportes. .
Ou seja, os serviços de transportes são uma das barreiras que pode impedir a progressão do acesso potencial para realizado. Daí a importância a contribuição de Penchansky e Thomas ao escandirem as barreiras em várias dimensões:i) disponibilidade do serviço, a acessibilidade do ponto de vista físico, ii) a acessibilidade do ponto de vista das condições de pagar pelo serviço, iii)aceitabilidade do serviço tanto pelo provedor como pelo usuário e iv) acomodação no sentido de ajustada as necessidades da população Essas barreiras envolvem fatores associados aos transportes, os quais são restritos aos dois primeiros de natureza espacial já que se reportam a localização da oferta do serviço e da acessibilidade física pelos usuários.
A disponibilidade refere-se ao número de pontos de serviço locais que um cliente pode escolher e, portanto está associado ao acesso. Já o segundo se remete diretamente a acessibilidade, isto é, a “impedimentos aos deslocamentos” (distância ou tempo) entre a localização do paciente e os pontos de serviço. Embora a distinção entre disponibilidade e acessibilidade possa ser útil as duas dimensões devem ser consideradas simultaneamente, especialmente quando se trata das populações residentes em pequenas cidades e nas áreas remotas nas quais, muitas vezes, os problemas de acessos são tratados como problema de acessibilidade.
3. Conclusão
Tendo em conta as barreiras de natureza espacial (o que traz no seu bojo a diferenciação sócio-cultural) avaliamos o enfrentamento do problema do acesso e da acessibilidade aos serviços básicos de saúde das populações rurais e remotas por meio TFD (Tratamento Fora do Domícilio). Esta política pode se ser considerado como uma tentativa de superação das restrições associadas a acessibilidade à atenção médica, embora muitas vezes ataque o problema de acesso.
Do ponto de vista da organização espacial admite-se como pertinente o TFD para os serviços de média e alta complexidade, quando se coloca o problema de acessibilidade, e, como impertinente o TFD para o acesso aos serviços básicos de saúde, quando se configura um problema de acesso.
Diante dessa possibilidade recomenda-se que se tome como referência um Índice de Acesso das Pequenas Cidades e áreas Remotas (McGRAIL & HUMPHREYS, 2009]. Este índice fornece uma medida de acesso sensível e apropriada para orientar as medidas políticas destinadas a superar problemas de acesso não só dos serviços de saúde de média e alta complexidade, mas também os serviços de baixa complexidade, o dita atenção primária. De forma a fundamentar o estabelecimento de uma política focada no TFD no primeiro caso, e, uma política de Médico de Família, ou algo assemelhado no segundo.
A justificativa para o uso deste Índice é que ele identifica as diferenças de acesso dentro das populações das pequenas cidades e das áreas remotas em uma escala geográfica muito mais precisa, diferenciando os problemas associados ao acesso dos vinculados a acessibilidade, de forma maximizar os recursos.
BIBLIOGRAFIA
APPARICICIO, P., ABDELMAJID, M., RIVA, M., & SHEARMUR, R. (2008). Comparing alternative approaches to measuring the geographical accessibility of urban health services: Distance types and aggregation-error issues. International Journal of Health Geographics, 7(7). doi:10.1186/1476–072x-7–7.
BARWELL, I., EDMONDS, G. A. & HOWE, J. D. F. G. (1985) Rural Transport in Developing Countries. Intermediate Technology Group, London.
FARRINGTON, J., & FARRINGTON, C. (2005). Rural accessibility, social inclusion and social justice: towards conceptualisation. Journal of Transport Geography, 13(1), 1–12
GURAGLIARDO, M.F., 2014 Spatial Acessessibility of Primary Care: Concepts, methods and challenges IN International Journal of Health Geographics, 2004 — Springer
GURAGLIARDO, M.F., RONZIO CR, CHEUNG, I, CHACKO, E, JOSEPH, JG: Physician accessibility: An urban case study of pediatric primary care. Health and Place. 2004
KHAN, AA, BHARDWAJ, SM: Access to health care. A conceptual framework and its relevance to health care planning. Eval Health Prof. 1994, 17: 60–76.
JOSPEH, A. E., & BANTOCK, P. R. (1982). Measuring potential physical accessibility to general practitioners in rural areas: A method and case study. Social Science & Medicine, 16(1), 85–90
JORDAN, C., & NUTLEY, S. (1993). Rural Accessibility and Public Transport in Northen Ireland. Irish Geography, 26(2), 120–132.
LEVESQUE, JF., HARRIS, M.F. & RUSSELL,, G. Patient-centred access to health care: conceptualising access at the interface of health systems and populations. Int J Equity Health 12, 18 (2013). https://doi.org/10.1186/1475-9276-12-18
McGRAIL, M. R., & HUMPHREYS, J. S. (2009). The index of rural access: an innovative integrated approach for measuring primary care access. BMC Health Services Research, 9(1).
MOSELEY, M. J., HARMAN, R. G., COLES, 0. B. & SPENCER, M. B. (1977) Rural Transport and Accessibility. University of East Anglia, Norwich, UK
OKATOR, F. C. (1990) The spatial dimensions of accessibility to general hospitals in rural Nigeria. Socio-economic Planning Science 24, 295–306.
SHANNON, G. W., SPURLOCK C W, GLADIN, S. T, SKINNER, J. L, 1975, “A method for evaluating the geographic accessibility of health services” Professional Geographer 27 30–36
SHENGELIA, B., MURRAY, CJL, ADAMS, OB., Beyond access and utilization: defining and measuring health system coverage. Health Systems Performance Assessment. Debates, methods and empiricism. Edited by: Murray CJL, Evans DB. 2003, Geneva: World Health Organization, 221–234.