MACHADO DE ASSIS: Civilização e Natureza — Ihering Guedes Alcoforado
Machado de Assis, na sua crônica de 14 de junho de 1885, trata da relação entre natureza e civilização, a partir da perspectiva que os “costumes da civilização corrompe tudo”.
A evidenciação da sua tese é feita em dois registros distintos: i) o do espaço publico circunscrito pelo “Cá Fora vs. Câmara Municipal e ii) espaço privado do defluxo e do lenço.
No registro do espaço público ele toma duas referência: a Câmara Municipal (CM) e o “Cá Fora”. A razão que apresenta para amar a CM “sobre todas as coisas deste mundo… é que ali a gente pode dizer o que tem no coração”, enquanto “..´cá fora´ tudo são restrições e cortesia…obras das conveniências, costumes da civilização que corrompem tudo.”
E arremata:
“Tudo ali (Câmara Municipal) parece respirar o estado social de Rousseau, é a pura delícia da natureza em primeira mão. Não há sêdas rasgadas, nem outras bugingangas e convenções.”
No segundo registro, o do espaço privado é estabelecido a partir da relação do refluxo com o lenço, o que é evidenciado por Machado de Assis ao chamar nossa atenção para o fato que
“A civilização, que não inventou, o defluxo, inventou o lenço, que dissimula o defluxo, guardando no bolso os seus efeitos. Mas a pura natureza ainda está com o chamado lenço de cinco pontas, que são, Deus nos perdoe, os próprios dedos que êle nos deu, e a sua regra é ir deixando os defluxos pelo caminho.”[MACHADO DE ASSIS,14 de junho1885] p.492
O problema mais uma vez é associado associado a civilização e a dissimulação representada pelo lenço, a qual contrapõe na “pura natureza” representada pelo ‘lenço de cinco pontas”, para ele é positivo que se “deite o resto ao chão”.
Enfim, como conclusão provisória podemos estabelecer a hipótese (melhor seria dizer chave de leitura) das crônicas políticas de Machado de Assis a partir de duas premissas. A primeira é que elas são em boa parte expressões do confronto entre civilização e natureza no Brasil em meados do século XIX. A segunda é que este confronto pode ser formalizado a partir de uma ontologia freudiana invertida, dado que o Mestre de Viena estabeleceu seu program~ça tendo como premissa a imposição da civilização e suas convenções sobre a natureza, enquanto o bruxo do Cosme Velho imaginava o avanço da natureza ( pura natureza) sobre as conveniências da civilização