LES AMOURS DE LA PIEUVRE (1967) de Jean Painlevé & Geneviève Hamon
IHERING GUEDES ALCOFORADO
Em A Vida Amorosa dos Polvos (Les Amours de la Pieuvre,1967) de Jean Painlevé & Geneviève Hamon, o olhar científico de Jean Painlevé embalado pela musica concreta de Pierre Henry traz a tona a vida romântica dos polvos, a qual é apreendida durante seus longo ritual de acasalamento e ciclo reprodutivo.
A partir do que insinua uma possibilidade normativa da nossa sociabilidade tendo como referência nossa condição animal: um telos recorrente na sua cinematografia que já foi nomeada surrealismo zoológico [CAHILL, ]. Essas insinuações normativas se expressa em Les Amours de la Pieuvre (1967) nas imagens de uma animalidade pura enfatizada pela bela trilha de musica concreta de Pierre Henry e nos close-up microscópico de um cientista cineasta.
Pierre Henry, no rastro do seu Mestre Pierre Schaeffer, foi um dos grandes impulsionadores do desenvolvimento da musique concrète. E foi o primeiro músico com formação formal a devotar suas energias ao meio eletrônico, liderando o Groupe de Research de Musique Concrète ao longo da maior parte da década de 1950.
Na trilha sonora de Les Amours de la Pieuvre (1967), Pierre Henry aplica uma das suas expertise no campo da musica concreta, ao incorporar o sonoridade da mobilidade do polvo no processo de composição da trilha sonora cuja descrição da sua concepção e produção é registrada no vídeo The Art of Sounds (2007) de Pierre Henry.
Em função do exposto acima considero a narrativa de Les Amours de la Pieuvre (1967) uma exemplificação emblemática da fusão do documentário científico e a musica experimental via a exploração do Principio da Coexpressabilidade e do Close-up dois insights de Erwin Panofsky presentes no seu artigo seminal Style and Medium in the Motion Pictures (1934) no qual trata das possibilidades estéticas i) Principio da Coexpressibilidade(principle of coexpressibity) instrumentalizado no filme via a sincronização das imagens com a musica concreta e ii) da técnica do close-up que no filme aludido magnifica as imagens do momento do acasalamento e da reprodução por meio da captação e integração dos seus sons naturais que são inseridos na trilha sonora. [2]
A evidenciação da estrutura narrativa de Les Amours de la Pieuvre (1967)requer múltiplas aproximações. Uma delas é propiciada via sua trilha sonora o que possível, a partir da perspectiva da simetria entre o mundo do som(world of sound) e o mundo da musica( world of music), tal como posto por Pierre Scheffer, tendo como pano de fundo o Principio da Expressibilidade. [3]
“ The sound world is natural […]the sound of the voice, the sounds of nature, of wind and thunder, and so forth. […] Sound is the vocabulary of nature.When we hear the wind, the wind says ‘I’m blowing’. When we hear water, the water says ‘I’m running’… and so forth. […] Opposing this world of sound is the world of music, the world of musical entities, of what I have called ‘musical objects’. These occur when sounds bear musical value. […] This is the symmetry between the world of sound and the world of musical values.[…] “The world of music is probably contained within DoRéMi, yes; but I’m saying that the world of sound is much larger than that. [SHAEFFER, 1987:3 e 6]
Resumindo: No filme (Les Amours de la Pieuvre,1967) a integração do mundo do som com o mundo da musica expressa, portanto, o Princípio da coexpressibilidade (principle of coexpressibilty) de Erwin Panofsky, o qual é potencializado pelo close-up mediado por microscópios. Nesse arranjo a ausência do elemento dialógico é, em parte, compensada pela sincronização close-up microcópicos sincronizados com a trilha sonora que feita por Pierre Henry, integra os sons naturais dos movimentos dos polvos numa matriz sonora articulada a partir dos princípios da musica concreta:
“[…] given the qualification of the performers every subtle movement of the features, almost imperceptible from a natural distance, becomes an expressive event in visible space and thereby completely integrates itself with the expressive content of the spoken word…”[PANOFSKY, 1934/2012:21]
Por fim, é importante ressaltar a dimensão política implícita na trilha sonora de musica concreta. Pierre Schaeffe na sua entrevista a Tim Hodgkinson, em 2 de maio 1986, considera o experimentalismo que resultou na musica concreta como um movimento de liberação musical (da invasão austríaca da musica dos 12 tons) que. complementa o movimento que levou a liberação politica no pós guerra:
“[…] after the war, in the ’45 to ’48 period, we had driven back the German invasion but we hadn’t driven back the invasion of Austrian music, 12-tone music. We had liberated ourselves politically, but music was still under an occupying foreign power, the music of the Vienna school [….] the Vienna school was also inspired by scientific ideas, by a rigour coming from a discipline which wasn’t music but an algebraic equation […] the development of music, is a process that is shaped by the human, the human ear, and not the machine, the mathematical system..”[SHAEFFER, 1987:2–3]
Enfim, temos um filme que resulta de uma integração profunda entre musica concreta e vida animal numa obra que sendo animalesca demasiada animalesca, se revela não só humana demasiada humana, mas política demasiada politica.
NOTA
[1] “ Musique concrète is music made of raw sounds: thunderstorms, steam-engines, waterfalls, steel foundries… The sounds are not produced by traditional acoustic musical instruments. They are captured on tape (originally, before tape, on disk) and manipulated to form soundstructures. The work method is therefore empirical. It starts from the concrete sounds and moves towards a structure. In contrast, traditional classical music starts from an abstract musical schema. This is then notated and only expressed in concrete sound as a last stage, when it is performed.[HODGKINSON, 1987]
[2] Apenas para lembrar registro que para Erwin Panofsky o Principio da coexpressibilidade (principle of coexpressibilty) estabelece que
In a film, that which we hear remains, for good or worse, inextricably fused with that which we see; the sound, articulate or not, cannot express any more than is expressed, at the same time, by visible movement; and in a good film it does not even attempt to do so. To put it briefly, the play or, as it is very properly called, the “script” of a moving picture is subject to what might be termed the principle of coexpressibilhy .[PANOFSKY, 1934/2012:21]
BIBLIOGRAFIA
COMITO, Terry., 1980 Notes on Panofsky, Cassirer, and the “Medium of the Movies” IN Philosophy and Literature 4(2):229–241
HODGINSON, Tim., Introduction: What is Musique Concrète ? IN An interview with Pierre Schaeffer (02/05/1986) — pioneer of Musique Concrète IN ReR Quarterly magazine, volume 2, number 1, 1987
SCHAEFFER, Pierre., 1987 An interview with Pierre Schaeffer (02/05/1986) — pioneer of Musique Concrète IN ReR Quarterly magazine, volume 2, number 1, 1987
PANOFSKY, Erwin., Style and Medium in the Motion Pictures IN CARDULLO, Bert (ed.) Stage and Screen Adaptation theory from 1916 to 2000. Continum 2012