GEORGE STEINER: Um Crítico de Michael Foucault

Ihering Guedes Alcoforado
4 min readJan 3, 2021

IHERING GUEDES ALCOFORADO

O ano de 2020 foi de grandes perdas, entre as quais destaco a de George Steiner, um dos mais influentes crítico do século XX e, que se nos deixou em em 03 de fevereiro de 2020.

George Steiner foi um grande mestre, e como tal, o tempo funciona como fermento no seu legado, evidenciando sua perenidade, a qual é registrada não só nos seus livros, mas principalmente nos artigos. Os livros são produzidos sob restrições distintas dos artigos. Naqueles a influência dos editores e dos leitores condicionam a formatação e edição do texto, o que funciona como mediação entre o leitor e o autor na sua impressão primal. Enquanto os artigos, em especial os de jornais, expressam a reação imediata do autor, nos proporcionando uma maior intimidade com seu frame e genialidade

Em função disso, no momento do aniversário do primeiro ano do passamento em 03 de fevereiro de George Steiner, me motivei de ir ao encontro do seu legado registrado, não nos livros mas nos artigos, tendo como critério de seleção dos textos, os dedicados a alguns dos pensadores contemporâneos mais influentes, detendo-me na sua recepção de Michel Foucault.

Michel Foucault é um representante emblemática do que Steiner considerava a vida intelectual francesa, a qual via como um cenário com suas estrelas e polêmicas histriônicas, com claques e fiascos e no qual transitaram Sartre, Levi-Strauss, os “estruturalistas-maoista” , Lacan com seus impenetráveis soliloquios sobre semântica e psicanalise e, por fim Foucault, a quem considerava um idiossincrático solitário, a última estrela a brilhar no cenário referido, e, cujas idéias, George Steiner não considera novas mas, reconhecia que elas que portavam “[…] an intense learning and breadth of philosophic suggestion.” [STEINER, 1971]

A recepção de Michel Foucault por George Stiner será apresentada por meio de sua crítica a obra “Les Mots les Choses” (1966) por ocasião do lançamento da sua tradução ao inglês, nomeada de “The Order of Things” (1970).

A recepção de George Steiner da obra de Foucault não poderia ter sido mais ácida, resultado de múltiplos estranhamentos o que ele expressa em diferentes escalas e por etapas.

Na escala micro, a primeira etapa é estranhamento natural de George Steiner, um filosofo da tradução, com o anonimato da tradução:

The translator (whom, with mad dening disregard for human effort and responsibility, the publisher leaves anonymous) has striven hard.” [STEINER, 1971]

Num plano macro, ou seja, o da totalidade da obra de Foucalut, George Steiner inicia inserindo-a no seu seu contexto intelectual do qual emerge, o francês, o qual é segundo ele, marcado por modas:

“Faced with almost four hundred pages in a similar vein, one must ask oneself, “Why bother?” Is this kind of thing to be taken seriously, or does it belong, with a good deal else that has come out of recent French “post‐structuralism” and German “hermeneutics,” to “the murmur of the ontological continuum”? Is anything being said here, which can be grasped and verified in any rational way?” [STEINER, 1971]

Em seguida, ele trata da recepção propriamente dita, que se expressa na sensação produzida pela sua leitura:

“[…] an honest first reading produces an almost intolerable sense of verbosity, arrogance and obscure platitude. Page after page could be the rhetoric of a somewhat weary sybil indulging in free association. Recourse to the French text shows that this is not a matter of awkward translation.” [STEINER, 1971]

E justifica tal sensação dirigindo seu foco ao plano dos detalhes, e, para tanto chama atenção para algumas enunciações-insight de Foucault. A primeira é a que afirma que a lei da natureza é constituída pela diferença entre palavras e coisas, , o que segundo G Steiner não tem nenhum significado. A segunda se refere a temporalidade atribuída por Foucault à literatura, como um conceito muito recente; quando na verdade, segundo Steiner se remonta a antiguidade clássica:

“ What is one to make of such grandiloquent mis statements as that which proclaims “literature” to be a very recent concept, when we know that the specialization of language for literary purposes was thoroughly understood by Thucydides and Plato and formalized as early as Cicero? [STEINER, 1971]

Enfim, em apenas uma página, uma crítica demolidora, tanto no atacado, como no varejo, com evidências textuais contundentes, o que motivou uma resposta de Foucault, no mesmo tom, por meio de um artigo que será tratado na próxima nota.

BIBLIOGRAFIA

FOUCAULT, Michel., 1970 The Order Of Things. An archaeology of the human sciences. London: Tavistock Publications

STEINER, George 1971 The Order Of Things IN .The New York Times, 1971 Feb. 28,, Section BR, Page 8

--

--

Ihering Guedes Alcoforado

Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal da Bahia.