ANOS DE CHUMBO: Ruptura do Jogo Político Nunca Mais — Ihering Guedes Alcoforado

Ihering Guedes Alcoforado
3 min readNov 15, 2021

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Sen. Humberto Lucena, um contraponto à intolerância extrema que alimentou os anos de chumbo

A revistação romântica dos “anos de chumbo” por meio de uma idealização dos ícones da luta armada perde a oportunidade de compreendermos as o contexto geopolítico que gerou causas e consequencias políticas da suspensão do estado de direito e o estabelcimento do estado de excessão.

A configuração do contexto que levou a ruptura política foi marcada no plano cultural pelo Maio de 68 e no plano político pela guerra fria que teve seu ápice com a revolução cubana. Donde nos indagarmos qual a relação entre Maio de 68 e a revolução cubana com a luta armada no Brasil: dois acontecimento sem conexão direta. Mas que convergiram na formação do contexto político que levou a estado de excessão e aos anos de chumbo.

Nesta nota margeio a relação entre Maio de 68 e a luta armada, tendo em vista evidenciar as raízes políticas dos anos de chumbo. Uma pista possível de ser explorada é a levantada recentemente por Nicola Tranfaglia que formula sua reflexão tendo como referência a experiência européia com as Brigadas Vermelhas.

Para ele a relação entre contestação estudantil, com a operária dos anos seguintes, não pode explicar o nascimento das formações terroristas. Embora reconheça que os movimentos sociais e trabalhistas nas suas diversas expressões manifestaram uma necessidade e uma vontade de mudança, não se pode considera que motivaram na primeira e segunda metade dos anos 70, entre outros, os fundadores das Brigadas Vermelhas.

Ele chama atenção que alguns dos fundadores e líderes das organizações terroristas participaram, com papéis mais ou menos importante, no 68 universitário ou no Outono quente, o que entende como uma obveidade, tratando-se de jovens que justamente através de 68 chegaram ao activismo político e continuaram a sua militância nos anos seguintes; mas longe de estabelecer, por si só, uma espécie de linha direta entre os dois fenômenos: Maio de 68 e a Luta Armada.

Maio de 68 e a Luta Armada são dois movimentos têm características muito diferentes: Maio de 68 foi um movimento de massa com orientação anti-autoritária expresso de forma emblemática nos seus slogans que não distiginguia o autoritarismo de direita do autoritarismo de esquerda. Enquanto a luta armada foi um movimento promovido por minorias intolerantes e radicais identificados com uma versão atualizada da Terceira Internacional dos anos 30 e 40, e, com regimes totalitáios então vigentes.

Em função, disso nossa conclusão provisória é que o terrorismo vermelho que também assolou o Brasil, parece cada vez mais fruto de múltiplos elementos: a ofensiva da direita incentivada pelos promotores da guerra fria e os aparelhos que apostaram na ′′ estratégia da tensão “, como uma forma de superação da crise ideológica da esquerda que não conseguia se impor por meio do jogo democrático.

O impasse gerou uma sensação ambígua no campo da esquerda intolerante: de um lado, um sistema político bloqueado porque desprovido de alternativas de superação do impasse por meio do jogo político democrático, ii) do outro lado, um novo horizonte político que se abria com o êxito da revolução cubana e, no meio disso tudo isso, a maior poteência militar do mundo decidida a não permitir que a replicação da experiência cubana.

Este último um fator decisivo na inflexão política estabelecida pelo golpe/contra-golpe de 64 com bem chamou atenção Valdir Pires no ato que organizamos em sua homenagem, no auditório da Faculdade de Economia da UFBA, quando ele justificou o recuo de Jango, que na avaliação do aparato militar janguista tinha então todas as condições militares para ressistir ao golpe de 1964, a informação passada por Santiago Dantas, na sua última intervenção política, que uma esquadra norte-americana já se dirigia para o Brasil para apoiar os golpistas.

Por fim, com essa singela reflexão me junto a todos os que buscam compreender os mecanismos que levou o Brasil aos anos de chumbo, e, assim criarmos coletivamente as condições cognitivas de apreender e, denunciar no nascedouro qualquer movimento de intolerância extrema, o que salvo engano me parece estar na raíz do movimento de romantização dos ícones da intolerância extrema, tanto a direita, como a esquerda. RUPTURA POLÍTICA NUNCA MAIS.

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Ihering Guedes Alcoforado
Ihering Guedes Alcoforado

Written by Ihering Guedes Alcoforado

Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal da Bahia.

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